Ministra Cármen Lúcia, relatora do Recurso Extraordinário no STF |
Foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) caso relativo à
forma de incidência do Imposto de Renda (IR) sobre rendimentos recebidos acumuladamente,
como ocorre no caso de disputas previdenciárias e trabalhistas. A Corte
entendeu que a alíquota do IR deve ser a correspondente ao
rendimento recebido mês a mês, e não aquela que incidiria sobre valor
total pago de uma única vez, e portanto mais alta.
A decisão foi tomada no Recurso Extraordinário (RE) 614406, com
repercussão geral reconhecida, no qual a União questionou decisão do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que reconheceu o direito ao recolhimento
do IR pelo regime de competência (mês a mês) e não pelo de caixa (de uma única
vez, na data do recebimento), relativo a uma dívida do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS) com um beneficiário. Segundo o presidente do STF, ministro
Ricardo Lewandowski, o julgamento solucionará pelo menos 9.232 casos
sobrestados nos tribunais de origem, que aguardavam a solução da controvérsia,
com repercussão geral.
Capacidade contributiva
O julgamento do caso foi retomado hoje com voto-vista da ministra
Cármen Lúcia, para quem, em observância aos princípios da capacidade
contributiva e da isonomia, a incidência do IR deve considerar as alíquotas
vigentes na data em que a verba deveria ter sido paga, observada a renda
auferida mês a mês. “Não é nem razoável nem proporcional a incidência da alíquota
máxima sobre o valor global, pago fora do prazo, como ocorre no caso
examinado”, afirmou.
A ministra citou o voto do ministro Marco Aurélio,
proferido em sessão de maio de 2011, segundo o qual a incidência do
imposto pela regra do regime de caixa, como prevista na redação original
do artigo 12 da Lei 7.713/1988, gera um tratamento desigual entre os
contribuintes. Aquele que entrou em juízo para exigir diferenças na remuneração
seria atingido não só pela mora, mas por uma alíquota maior.
Em seu voto, a ministra mencionou ainda argumento apresentado pelo
ministro Dias Toffoli, que já havia votado anteriormente, segundo o qual a
própria União reconheceu a ilegalidade da regra do texto original da Lei
7.713/1988, ao editar a Medida Provisória 497/2010, disciplinando que a partir
dessa data passaria a utilizar o regime de competência (mês a mês). A norma,
sustenta, veio para corrigir a distorção do IR para os valores recebidos depois
do tempo devido.
O julgamento foi definido por maioria, vencida a relatora do RE,
ministra Ellen Gracie (aposentada). O redator para o acórdão será o ministro
Marco Aurélio, que iniciou a divergência.
[...]
FIQUE POR DENTRO DO ASSUNTO:
A forma de incidência do Imposto de Renda sobre créditos
recebidos de ações previdenciárias ou trabalhistas sempre foi uma questão bastante
controvertida nos juízos e tribunais do país.
A matéria discutida e julgada no Recurso
Extraordinário de que trata a publicação de hoje, teve como objetivo responder
a seguinte indagação: aquele que não aufere renda mensal passível da incidência
do Imposto de Renda, é o obrigado, ao receber, de uma só vez, indenização
trabalhista (originária do descumprimento da lei por parte do empregador durante
meses/anos) ou previdenciária (oriunda
da inobservância da lei por parte do INSS por meses/anos), a pagar
IR pelo simples fato da somatória acumulada no tempo atingir a base para
cálculo do Imposto de Renda?
Como se sabe, o IR é uma modalidade de tributo que
incide sobre a renda e proventos de qualquer natureza. E como o próprio nome sugere,
somente há obrigação de pagar IR quando ocorre o fato gerador (fato/circunstância que faz gerar o tributo). E todo tributo tem o seu fato gerador: para o IPTU,
ser proprietário de prédio ou terreno urbano, para o ITR, ser proprietário de terra rural.
O fato
gerador do imposto de renda ocorre
justamente no momento em que a renda é auferida, situação que por consequência faz
surgir à obrigação tributária (dever de pagar o imposto ao físico).
Todavia, para encontrar/aferir o valor do imposto
que será entregue ao físico, é necessário analisar duas outras questões: a base de cálculo (o total da renda
auferida em espécie) e a alíquota (percentual
a ser calculado sobre a base de cálculo) utilizada no momento da realização do cálculo.
Somente de posse desses dois elementos – base
de cálculo e alíquota – é que é possível
calcular o montante a ser recolhido.
Aqui no Brasil o IR é graduado segundo a
capacidade do contribuinte. E isso ocorre em homenagem ao Principio da Progressividade Tributária, segundo
o qual os impostos devem onerar mais aquele que detiver maior riqueza tributável,
conforme dispõe o §1º., do art. 145, da Constituição Federal:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de
polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos
específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de
obras públicas.
§1º Sempre
que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente
para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os
direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as
atividades econômicas do contribuinte.
Diante dessa regra, quanto maior a renda auferida
pelo contribuinte, maior será a alíquota (percentual) a ser cobrada.
Insta ressaltar que, por determinação legal, nem toda
renda auferida pelo cidadão é tributável, ou seja, a norma tributária estabelece
regras que, dependendo do valor da renda, haverá isenção do dever de
pagar o tributo. Você certamente já ouviu alguém dizendo que é isento do
imposto de renda?
No que tange a matéria sob análise, a controvérsia
que existia anteriormente no judiciário – hoje superada por força dessa decisão proferida pelo E. STF – se dava em virtude da divergência que existia
entre juízos e tribunais acerca da forma de incidência do IR sobre créditos recebidos, de forma acumulada, por intermédio de ações
previdenciárias ou trabalhistas.
Para melhor esclarecer o nobre leitor, tomemos
como exemplo o caso hipotético de um trabalhador assalariado que, por força da
norma tributária, nunca teve obrigação de pagar IR.
Imaginemos que esse trabalhador laborou por mais
de 5 (cinco) anos para uma mesma empresa que em total descumprimento da legislação
trabalhista, inadimplia direitos como horas extras, adicional de insalubridade, férias, 13º
salário, e outros; que esse trabalhador ao ser demitido ingressou com uma ação perante
a Justiça do Trabalho pleiteando todos os direitos que fazia jus.
Consideremos que o trabalhador saiu vitorioso e que ao proferir a sentença o juiz estabeleceu como montante total da
condenação a importância acumulada de de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais).
A pergunta que não quer calar é a seguinte: no
momento do recebimento da importância determinada na condenação (50 MIL), deverá
ser descontado IR desse trabalhador na fonte pagadora?
Foi justamente essa a resposta dada pelo Colendo STF,
no julgamento do Recurso Extraordinário de nº 614406, ao decidir que os
rendimentos recebidos de forma acumulada (de uma só vez), como no exemplo do
trabalhador aqui utilizado, não podem ser tributados, tendo em vista que, se o
trabalhador tivesse recebido mês a mês não teria sido afetado pela incidência
da tributação, justamente por não ter base
de cálculo pra tanto.
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