Jornal "O Globo" de 26 de abril de 1962 |
Dentre os
temas mais aventados atualmente nas redes sociais, a famigerada “Reforma
Trabalhista” é o que mais têm se destacado com preocupação nos últimos dias, notadamente
pelo aguerrido e honrado trabalhador brasileiro, que sempre dependeu da força do
trabalho para garantir o sustento próprio e de seus familiares.
Na
realidade, trata-se de uma preocupação lógica e compreensível, afinal, essa catastrófica
reforma empreendida na legislação trabalhista, diga-se de passagem, aprovada na
“calada da noite” pelo impiedoso e desavergonhado parlamento brasileiro, constitui,
indiscutivelmente, o extermínio de mais de um século de conquistas obtidas pela
classe operária a troco de sangue, suor e lágrimas. Isso sem adentrar, pelo
menos nesse instante, na análise da gritante inconstitucionalidade de alguns
dispositivos que foram inseridos no corpo da CLT - Consolidação das Leis do
Trabalho.
Diante de
tantos questionamentos e opiniões desvencilhadas da verdade, de um lado observamos
o trabalhador cheio de dúvidas e incertezas de como será o amanhã das relações
de trabalho; do outro, o discurso falacioso e nefário daqueles que defendem duramente
a reforma e o capital estrangeiro, considerando que as novas regras
implementadas pela repudiada “reforma trabalhista” já entrarão em vigor no
próximo sábado, dia 11 de novembro, resolvemos tecer alguns posicionamentos com
o desígnio de tentar manter os nossos clientes, trabalhadores e seguidores informados
acerca do que mudará efetivamente com a reforma e, diferentemente do que pretendem
inserir na cabeça dos trabalhadores, demonstrar que o Direito do Trabalho jamais
pode ser considerado como vilão da recessão, muito menos pela irresponsável e
criminosa crise econômica que assola o nosso país.
Desde que
foi decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República
(o Temido!), em 13 de julho de 2017, a Lei 13.467 (Lei da “Reforma
Trabalhista”), que altera CLT e as Leis 6.019/74, 8.036/90, e 8.212/91, lamentavelmente,
entrará em pleno vigor no próximo sábado, 11 de novembro.
Inobstante
ter sido sancionada em 13 de julho do ano em curso, a referida lei ainda não
tinha entrado em vigor porque encontrava-se no período de vacatio legis, ou período de vacância, que é o tempo que decorre
entre a data da publicação e o dia em que ela entra em vigor, ou seja, que tem
seu cumprimento obrigatório. E conforme disposto em seu art. 6º, o período de vacatio legis estabelecido é de 120
dias.
Pois bem, para
fins didáticos, compre inicialmente ressaltar que a reforma trabalhista, basicamente,
encontra-se repousada sobre 04 (quatro) eixos desestruturantes, ou estruturantes,
para aqueles que andam dizendo que a reforma trouxe benefícios para o
trabalhador!!! Senão vejamos:
1º - POSSIBILIDADE DE MÚLTIPLAS
FORMAS DE CONTRATAÇÃO;
2º - PREVALÊNCIA DO NEGOCIADO SOBRE
O LEGISLADO;
3º - RESTRIÇÃO DE ACESSO A JUSTIÇA;
4º - COMBATE AS LIDES TEMERÁRIAS E A
MÁ-FÉ PROCESSUAL.
Para início
de conversa, hoje pretendemos nos debruçar exclusivamente sobre parte do 1º
eixo da reforma, qual seja, sobre a POSSIBILIDADE DE MULTIPLAS FORMAS DE
CONTRATAÇÃO. E a primeira
delas é a que a própria lei, com as alterações implementadas no art. 443, da
CLT, passou a chamar de “CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE”.
Para fins
de melhor esclarecer, segue a redação do referido dispositivo de lei antes e
depois da reforma:
ANTES DA REFORMA
|
DEPOIS DA REFORMA
|
Art.
443. O contrato individual de
trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por
escrito e por prazo determinado ou indeterminado.
|
Art. 443. O contrato individual de
trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por
escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.
|
Com o
desígnio de conceituar o significado de “trabalho intermitente”, o próprio §3º
do art. 443 da CLT, foi categórico ao expressar que:
"§ 3º Considera-se como intermitente o
contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é
contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de
inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de
atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas,
regidos por legislação específica".
Trocando em
miúdos, sabe o que isso implica dizer? Que o trabalhador agora deixou de ser apenas
parte integrante dos contratos de trabalho, para ser tratado como um “objeto”,
respeitosamente, que ficará à disposição do empregador. Isto mesmo,
o trabalhador agora poderá ser tratado como um mero objeto, uma ferramenta de
trabalho que ficará a disposição do empregador que somente o convocará para
laborar quando PRECISAR, pois a lei autoriza que o contrato de trabalho seja de
caráter intermitente, com pausas que podem durar horas, dias ou até meses,
pagando apenas salário proporcional as horas ou dias efetivamente trabalhados.
A nova
regra ocasionará enormes prejuízos ao trabalhador, que ficará impossibilitado
de saber qual será o valor do seu salário no final do mês, notadamente ao ter o
seu contrato de trabalho pausado, por decisão do empregador, por horas, dias ou
meses, sem ter o direito de receber a devida contraprestação, ou seja, será
tratado como objeto/ferramenta de uso voluntário que somente receberá salário
quando houver a demanda de serviço na empresa.
Uma vez
pactuado contrato de trabalho de caráter intermitente, o empregado não saberá
quantas horas irá trabalhar, muito menos quanto irá perceber de remuneração no final
do mês. Segundo a lei, basta apenas que
o patrão sinalize a necessidade de serviço no prazo mínimo de 3 dias antes da
necessidade.
Como se vê,
ao contrário dos argumentos falaciosos apresentados pela banda podre do Congresso
Nacional que defende a reforma em nome do capital estrangeiro, a nova lei trouxe
prejuízos nefastos ao trabalhador, que doravante terá o seu salário considerado
uma verdadeira incógnita. Aliás, recentemente tive a oportunidade de ouvir de um
juiz do trabalho que o salário do trabalhador admitido nessa modalidade de
contratação deveria ser chamado de “Salário Kinder Ovo”.
Para aqueles que não sabem, o “kinder ovo” é aquele ovinho de chocolate fabricado pela Kinder, que
sempre vem com uma surpresa em seu interior, na maioria das vezes, nada muito agradável!!!
Para que o
nobre leitor tenha uma dimensão do problema, já existem grandes empresas
oferecendo contratos de trabalho com remuneração de R$ 4,50 (quatro reais e
cinquenta centavos) por hora trabalhada, mas para apenas 05 (cinco) horas semanal, logicamente nos finais de semana, quando ocorre os maiores
movimentos. Tais propostas estão sendo ofertadas por algumas marcas famosas que
atuam no ramo de lanches em todo país e no mundo. Aquelas que só encontramos
nas grandes cidades ou nos shoppings centers.
Como se não
bastasse esse absurdo, já observei vários empreendedores dizendo: “Opa!... Que coisa
boa, a reforma já começa apresentar nortes para economia através de novas
ofertas de emprego!!!”.
Seria muito
bom, se não fosse cômico e trágico, pois, pelo que consigo ver, a reforma apresenta
nortes apenas para o bolso dos patrões, notadamente estas empresas que estão
oferecendo 05 (cinco) horas de trabalho aos finais de semana. Trocando
em miúdos, isso implica em dizer o seguinte:
o trabalhador contratado nessa modalidade, percebendo apenas R$ 4,50 por
hora trabalhada, laborando 5 horas no final de semana, não conseguirá comprar o
mais singelo lanche vendido pelo seu empregador, que custa, no mínimo, R$ 30,00
(trinta) reais. Ou seja, irá trabalhar 5 horas, mas não conseguirá comprar sequer
o lanche indispensável à sua alimentação.
São estes,
nobres clientes, trabalhadores e leitores, os benefícios trazidos pela Lei
13.467/2017, denominada pelo parlamento brasileiro como “Reforma Trabalhista”.
As conclusões, ficam por sua conta.
COMPARTILHO UM PENSAMENTO:
O que vivemos
hoje nada mais é do que reviver o passado. Como dizia o inesquecível
Cazuza: “nesse museu de grandes novidades, o futuro revisitando o passado”. E como demonstração disso, fiz questão de compartilhar a página principal do Jornal “O Globo”, de 26 de abril de 1962, quando o 13º mês de
salário foi considerado pela imprensa como “desastroso” para o país.
Em síntese, esse
discurso falacioso de que o Direito do Trabalho é o responsável pela
derrocada da economia brasileira é de uma maldade sem precedentes, pois, ao
contrário do que dizem, o Direito do Trabalho é quem legitima o sistema
capitalista de um país, afinal, apenas por meio do trabalho digno é que as
pessoas conseguem se inserir na sociedade capitalista e promover a geração de
renda, tributos e a circulação de riquezas!!!
NOSSA
PROPOSTA:
Seguiremos
detalhando os demais eixos da reforma nas próximas publicações, esperamos que esse
trabalho possa ser de grande utilidade prática na vida pessoal e profissional
de todos aqueles que nos seguem e despertam interesses pelo apaixonante mundo
do direito material e processual do trabalho.
O convite
está feito!!!
RONALDO MARINHO
Advogado Trabalhista em Campina Grande, Paraíba.
Nenhum comentário:
Postar um comentário